Cada vez mais a é notória a importância do cuidar recair sobre a Saúde Emocional e Espiritual.
A Saúde deixa de ser ausência de doença para se tornar um bem-estar físico, psíquico, social e espiritual.
Num Paradigma Holístico, as Dimensões psicossociais e espirituais ganham destaque. Como resultado, as pesquisas que demonstram que o apoio emocional e espiritual são essenciais e influenciam o modo como os utentes experienciam as doenças.
Sendo, cada vez mais, difícil ignorar estas necessidades, reitera-se que os profissionais da saúde coloquem enfase sobre a saúde emocional e espiritual e que devem obter um histórico/colheita de dados que inclua esta informação e documentá-la, assim como o fazem em relação aos aspetos físicos.
Além das necessidades dos utentes é também imprescindível atender às necessidades da família e cuidadores informais.
A família desempenha um papel central na vida do utente. É dentro da família que as pessoas crescem, são nutridas, obtêm a sensação de si próprios, cultivam crenças e valores sobre a vida, e progridem nos vários estádios de desenvolvimento.
Uma Importante função da família é proporcionar os recursos físicos e emocionais para manter a saúde e um sistema de apoio nos momentos de crise, como nos períodos de doença. No entanto, dada à exigência, absorvência e risco de desgaste físico e emocional associada ao cuidado do doente crónico, também é um dos principais alvos de cuidados pela equipa de saúde.
O enfermeiro constitui um recurso fundamental neste processo. Como tal, torna-se imperioso que este seja capaz de reconhecer e validar a dimensão emocional e espiritual e o seu real significado. A identificação dos indicadores destas dimensões (emocional e espiritual) são essenciais para uma intervenção adequada em enfermagem. Pois só assim, podemos avaliar, diagnosticar e intervir baseados numa metodologia objetiva e que vá ao encontro das reais necessidades do utente e família.
Na Classificação Internacional para a prática de enfermagem (CIPE) podemos definir a intervenção “Apoiar“ como o fenómeno de assistir, ajudar social ou psicologicamente alguém a ser bem-sucedido, a evitar que alguém ou alguma coisa fracasse, suportar o peso, a manter-se em posição e a aguentar.
O conceito Saúde Emocional engloba a capacidade de uma pessoa funcionar da maneira mais confortável e produtiva possível.
As pessoas mentalmente saudáveis são capazes de identificar compreender e expressar as suas emoções, tendo em conta os contextos e emoções dos outros.
Podemos definir emoções como experiências subjetivas desencadeadas por um acontecimento, pessoa, situação, podendo ser acompanhadas por reações orgânicas, gestos, movimentos expressões vocais. As emoções são dirigidas para o exterior, são públicas, tendo uma dimensão comunicacional. A sua duração é breve, caracterizando-se pela intensidade da sua expressão.
Barbosa refere-se à Espiritualidade como:
“…Perspetiva pessoal complexa, abrangente, multidimensional, sistémica e integradora da experência humana que através de questionamento e reflexão, contemplação, meditação e oração avalia os aspectos materiais existenciais (perspetivas, comportamentos, relações, projetos e realizações) da vida conduzindo à consciência da transcendência nas suas dimensões :biográficas, situacional ou cósmica ajudando a manter a relação consigo próprio, com os outros, com entidades superiores ou forças vitais, para procurar eventuais significados e propósitos de vida e sentimentos de ligação/conexão e de paz interior.”
O mesmo autor refere que o mais importante não será tanto o definir papéis e competências profissionais estritos nesta área, mas sim criar potencialidades e estabelecer uma atitude de reconhecimento de valor e dignidade humana.
Assim, enfatiza seis dimensões fundamentais no acompanhamento Espiritual:
- Consciência da problemática existencial;
- Atitude para a espiritualidade;
- Respeito pelo religioso;
- Acolhimento da fé;
- Facilitação da transcendência;
- Acompanhamento da esperança;
- Envolvimento compassivo.
Características da Espiritualidade:
- Universal (está presente em todos os seres humanos)
- Pessoal (variável, balanceando níveis de desenvolvimento e acontecimentos de vida)
- Global (permeia a globalidade da vida)
- Multidimensional (integra várias dimensões)
Modelo multidimensional da espiritualidade:
- Reconciliação existencial
- Plenitude existencial
- Serenidade/ propósito existencial /Estar em paz
- Propósito existencial
- Transcendência
Podemos depreender então, que apoio emocional e espiritual consiste numa serie de intervenções por parte do enfermeiro, que auxilie, assista, eduque o utente e família a gerir, expressar, integrar essas experiencias subjetivas, de modo a alcançar equilíbrio emocional e espiritual.
Focos/áreas de atenção relevantes para a intervenção de enfermagem no apoio emocional: Angustia, Ansiedade, Ciúme, Culpa, Esperança, Frustração, Insegurança, Inveja, Luto, Medo, Nervosismo, Prazer, Raiva, Sentimento de impotência, Sofrimento e Solidão.
Focos/áreas de atenção relevantes para a intervenção de enfermagem no apoio espiritual: Crença espiritual, religiosa, religiosa negativa, religiosa positiva.
Dimensões do apoio emocional e espiritual
Ansiedade
Segundo Barbosa, et al, a ansiedade adaptativa com intensidade moderada á ameaça tem tendência a aliviar progressivamente quando a ameaça diminui ou desaparece. A ansiedade transitória pode ser descrita como um medo ou um sentimento desagradável de desamparo. No fundo, é uma consequência normal e esperada das incertezas da doença e da aproximação da morte. A ansiedade pode tornar-se desadaptativa com a intensidade desproporcional à ameaça e com o aumento anómalo da frequência intensidade ou duração de sintomas físicos e psicológicos. Algumas das manifestações da ansiedade são:
Físicas: alteração do apetite, cefaleias, tensão muscular, fadiga, letargia, desconfortos digestivos, palpitações, hipertensão;
Emocionais: Esquecimento, baixa produtividade, má concentração, atitude negativa, confusão, tédio, frustração, depressão, desencorajamento, riso nervoso;
Espirituais: vazio, perda de significado, dúvida, rancor, martírio, perda de direção, cinismo, apatia
Medo
A palavra medo provém do termo latim metus. Trata-se de uma perturbação angustiosa perante um risco ou uma ameaça real ou imaginária. O conceito também se refere ao receio ou à apreensão que alguém tem de que venha a acontecer algo contrário àquilo que pretende.
O medo é uma emoção que se caracteriza por um intenso sentimento habitualmente desagradável. Por norma, é provocado pela perceção de um perigo, seja ele presente ou futuro, real ou suposto. Além disso, é uma das emoções primárias que resulta da aversão natural à ameaça. Sob a perspetiva da biologia, o medo é um esquema adaptativo. Assim, constitui um mecanismo de sobrevivência e de defesa que permite ao indivíduo responder face a situações adversas rápida e eficazmente.
Para a neurologia, o medo é uma forma comum de organização do cérebro primário dos seres vivos, com a cativação da amígdala alojada no lóbulo temporal.
Do ponto de vista da psicologia, o medo é um estado afetivo e emocional, necessário para o organismo se adaptar ao meio.
Relativamente ao aspeto social e cultural, o medo faz parte do carácter de uma pessoa ou de uma organização social. Posto isto, pode-se aprender a não temer.
Segundo a CIPE, medo consiste numa Emoção negativa: sentir-se ameaçado, em perigo ou perturbado devido a causas conhecidas ou desconhecidas, por vezes acompanhado de uma resposta fisiológica do tipo lutar ou fugir.
Esperança/ Desesperança
A esperança, etimologicamente derivada do Latim sperantia, é definida como a “confiança em se conseguir o que se deseja, expectativa”.
Enquanto verbo, “esperar” significa “aguardar; manter-se em expectativa; confiar”.
Porto Editora, 2013
A Esperança é inerente à vida humana, intimamente relacionada às várias dimensões da esfera pessoal, familiar, profissional e social. É também habitualmente associada à expetativa positiva em relação ao futuro.
No caso de utentes paliativos, quando a cura não é possível, e existe a probabilidade de morte a curto prazo, poder-se-ia depreender que é fácil perder a esperança.
Segundo Querido, num aparente paradoxo, esta surge repetidamente no discurso desses doentes como um recurso e uma importante estratégia de coping tanto para suportar a dor e o sofrimento, como para lidar com a incerteza.
A Esperança constitui um direito fundamental dos doentes reconhecida formalmente na “Carta dos Direitos do Doente Terminal“.
A Carta refere que a pessoa tem o direito a ser cuidada por alguém que consiga manter um sentido de esperança, apesar do seu foco poder ser modificado. Maiores índices de esperança estão relacionados com melhor saúde física, melhorando a capacidade de coping e aumentando a tolerância à dor, reduzindo a ansiedade e minimizando os sintomas depressivos.
Em estudos realizados, constata-se que a esperança persiste ao longo da trajetória da doença. Inclusive, o seu decréscimo é acompanhado pelo aumento da dor psicológica e do sofrimento. Ao longo do processo se doença o foco da Esperança é modificado, realinhada e redimensionada (Querido,2016).
Fases do Processo de transição da esperança na doença crónica avançada: Esperança de cura, tratamento, prolongamento de vida, de uma morte serena.
Solidão
Podemos entender solidão como sendo uma emoção negativa. Um sentimento prolongado de grande pena associado a martírio e à necessidade de tolerar condições devastadoras. Em suma, sintomas físicos crónicos como a dor, desconforto ou lesão, stress psicológico crónico, má reputação ou injustiça.
Coping
O emergir de uma situação de saúde/doença, quer para a pessoa, quer para a família, numa qualquer etapa do ciclo de vida individual e familiar, afeta a sua estabilidade e consequentemente a saúde da própria família.
A família vê-se confrontada com a necessidade de desencadear estratégias de coping eficazes de forma a minimizar as repercussões causadas, tendendo novamente para o equilíbrio. A forma como os doentes e seus familiares analisam e interpretam a transição pela qual estão a passar no seu estado de saúde/doença está diretamente relacionada com a sua qualidade de vida.
Coping representa atitude de gerir stress e ter uma sensação de controle e de maior conforto psicológico.(CIPE,2016)
Estratégias de coping são mecanismos cognitivos e comportamentais para fazer face a situações geradoras de stress.
A intervenção de enfermagem deve surgir quando os fatores do ambiente se apresentam como stressantes para aquela pessoa/família, na tentativa de que não surja um desequilíbrio afetando a qualidade de vida. A pessoa é vista como um sistema que está em constante adaptação, utilizando para isso processos interiores, estratégias de coping inatos ou adquiridos. A enfermagem age de forma a aperfeiçoar a interação da pessoa com o ambiente, para fomentar a adaptação.
Sobrecarga por stress
O stress caracteriza-se por uma resposta do organismo, expressa por meio de manifestações de natureza física e psicológica que podem ocorrer frente a situações que causem instabilidade de humor, medo ou insegurança e ansiedade (Lipp, 2001).
O stress é composto de três fases: alerta, resistência e exaustão.
Tais fases são desencadeadas diante da presença de agentes stressores e podem produzir um conjunto de respostas fisiológicas. Estas podem ir desde a preparação para uma ação (fase de alerta), esforço de adaptação em função de um estímulo duradouro (resistência) que se não enfrentado adequadamente favorece o surgimento de doenças, até uma situação mais grave (exaustão) com a presença de problemas físicos, emocionais e sociais que afetam a vida pessoal e profissional e em casos extremos pode levar o indivíduo a óbito (Lipp, 2003).
Segundo Maurin e Boyd (1990) a sobrecarga pode ser objetiva e subjetiva.
- Sobrecarga objetiva é definida como algo observável, resultando em custos concretos para a casa decorrente da doença mental, desestruturação da vida cotidiana na família e prejuízos financeiros.
- A sobrecarga subjetiva é definida com a avaliação que cada indivíduo faz da situação e a percepção (mensuração) da sobrecarga envolvida no cuidado. Para as autoras o que distingue tais conceitos de sobrecarga são as especificidades dos problemas associados com a doença mental do paciente. Cassis et al. (2007) acrescentam ainda o termo sobrecarga emocional e apontam que a sua presença pode trazer prejuízos tanto na saúde de pacientes (repetição de hospitalizações) como de cuidadores (adoecimento e até mesmo óbito).
Aponta-se ocorrências em cuidadores formais e informais de alterações no sistema imunológico, problemas relacionados ao sono, fadiga crónica, alterações cardiovasculares, depressão e ansiedade, os quais se apresentam superiores à média geral da população (Marote, Carmem, Leodoro, & Pestana, 2005).
Cuidador formal a pessoa contratada financeiramente pelo paciente e/ou familiares para realizar o cuidado (Duarte, 1997).
Cuidadores informais são familiares, pessoas amigas, vizinhos ou voluntários que assumem o cuidar sem preparo técnico e que não são remunerados (Stone, Cafferate, & Sangl, 1987).
Angustia espiritual
A Espiritualidade é definida como uma conexão entre o eu(self), os outros, uma força de vida ou Deus, que permite que as pessoas experimentem a auto transcendência e encontrem significado na vida.
Smeltzer & Bare,2002
Pode ser considerada como uma metamotivação existencial deriva do latim “spiritus”, que significa respiração, vento,” o espirito é que dá vida à pessoa
Barbosa, 2016
O Diagnóstico de enfermagem angústia espiritual é aplicável àqueles que apresentam um distúrbio no sistema de crença ou de valores que proporcionam a força, esperança e significado de vida.
Smeltzer & Bare,2002
Angústia espiritual/ Angustia: Rotura com o que a pessoa acredita acerca da vida, questões acerca do sentido da vida, associada ao questionar do sofrimento, separação dos laços religiosos ou culturais, mudança nos sistemas de crenças e valores, sentimentos de intenso sofrimento e zanga contra a divindade.
CIPE,2015